domingo, 20 de maio de 2012

...COISA DE AMIGO

                                                                         

          Aprendi com meu filho, hoje com 15 anos, uma expressão que embora simples serve como critério de avaliação do comportamento em nossa relações: “Isto não é coisa de amigo”. Quando aos três anos participou do primeiro grupo do projeto Oficina de Criação, trouxe para o ambiente familiar esta expressão mudando o paradigma de relacionamento em nossa casa. Comecei a entender que mesmo entre pais e filhos o compromisso deve ser com o respeito mútuo, o que foge aos padrões antigos onde o filho deve respeito aos pais e ponto. A partir desta essencial ideia, pude ver que para um verdadeiro encontro afetivo faz-se necessário o reconhecimento da criança como um sujeito que em toda sua particularidade deve ser respeitado.
           
          Amigo não fala de outro como se ele não estivesse presente. Quantas vezes as crianças testemunham seus pais, professores e etc, tratando de questões que lhe dizem respeito com outros, criando, no mínimo, uma situação constrangedora. Isto não é coisa de amigo! E quando adultos reagem com demasiada irritação frente aos erros das crianças, como se gente grande acertasse sempre? Adultos também entornam coisas, quebram, perdem... Pode-se imaginar amigos que se insultam por conta de acidentes como estes? Sem contar as falas do tipo “Come rápido!” “Anda depressa!”, “Sai fora daí!”, “Cala a boca!”, “Pega!” “Faz!”... Amigo solicita, não ordena. Amigo não grita com o outro! Penso que nem com os animais deva se proceder desta forma, deseducada!
         
          Sabe-se que quanto mais nova a criança, menor sua possibilidade de aprender pelo que ouve. Elas precisam de exemplo. Se perguntássemos aos pais o que esperam de seus filhos, ouviríamos respostas do tipo: “Que seja justo, verdadeiro, solidário, tolerante...” Mas, tem as crianças reconhecido estes comportamentos em seus pais? Há aqueles que enganam suas crianças, se escondem, fogem...! Não se pode esperar nada diferente destes filhos.

          Logo que uma criança completa sua primeira etapa de desenvolvimento e passa a conviver em grupos sociais fora do seu familiar, se vê diante do desafio de explorar um mundo maior. “Que mundo será este?” “Quem é o outro?” “Quem sou eu?” À medida que interage socialmente vai amadurecendo e internalizando valores morais passando da condição de anomia (ausência da possibilidade de compreender e cumprir regras, até dois anos aproximadamente) para a autonomia moral (ética internalizada, compreensão dos valores morais, por volta dos doze anos). Esta autonomia moral está condicionada à eficácia das etapas anteriores. Ou seja, dependerá da forma como esta criança foi tratada. Uma educação respaldada no autoritarismo e nas punições resultará num adulto inseguro, incapaz de conduzir-se às boas ações por amizade, sendo levado a se comportar adequadamente por razões terceiras como prêmios e castigos e não e por consideração ou sentimento de justiça. São aqueles que esperam para fazer quando não tem ninguém olhando. Quem nunca presenciou um pai dizer: “Estuda direitinho e ganhará uma bicicleta” ou “Se bater no coleguinha vai perder o recreio.” Assim a criança é condicionada a não fazer coisas erradas, sem necessariamente entender as reais razões.

          É conteúdo da Educação Infantil, conforme parâmetros estabelecidos nacionalmente, a formação pessoal e social da criança, sua identidade e autonomia. Costumo brincar que este é o momento em que a criança vai descobrir-se gente ao mesmo tempo que descobre os outros. Muitos pais e professores insistem em “ensinar” o que pode e o que não pode, no tocante aos relacionamentos, sem no entanto ter como fundamento a questão do afeto, da amizade.

          Aprender a conviver, um dos quatro pilares da educação segundo o relatório para Unesco da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI, coordenada por Jacques Delors, passa pela condição e possibilidade de reconhecer o valor do outro, ao mesmo tempo em que se experimenta o Aprender a ser, ampliando o alcance do Aprender a conhecer e do Aprender a fazer resultando numa educação integral.   Nossas crianças nos dão a chance de repensar e reformular antigos conceitos. São elas, as de menor idade, que podem nos mostrar o caminho do amor, da solidariedade, da tolerância, da paz! Elas precisam aprender a fazer amigos. Mostremos a elas o caminho oferendo-lhes nossa amizade.

                                                                  Susi Emerich

                                                     

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