No dia 31/3, tive a
oportunidade de assistir a uma apresentação superinspiradora de Gandhy Piorski, artista plástico e pesquisador das
práticas da criança sobre o tema Criança
e Natureza, que me é tão caro e é tema deste blog. O encontro foi na sede do Instituto Alana, em São Paulo, durante a segunda
videoconferência da série Diálogos
do Brincar, e que já está disponível
online.
Suas palavras
tocaram tanto os presentes e provocaram tantas questões – da audiência que acompanhava a conferência pela
internet também – que resolvi aceitar o convite de Mônica Nunes, editora do
Conexão Planeta, e rever esse encontro para produzir o post de hoje. O que
destaco aqui é fruto de minhas reflexões.
Ele começou dizendo
– tão poeticamente – que a criança ama sondar, desvendar os mistérios da natureza e que ela
precisa disso pra se enraizar no universo da cultura em que vive. A
natureza é mistério, e disso as crianças entendem! Elas reconhecem o mistério
das coisas vivas e brincam com elas para se aproximar, chegar perto do segredo,
da essência das coisas.
“A natureza ama ocultar-se” diz o
famoso aforismo de Hieráclito, filósofo que viveu na segunda metade do século
VI a.C., lembrado por Piorski. A natureza está sempre emergindo, num fluxo
permanente e contínuo. Ao se aproximar de um ponto, já se está no seguinte. Por
isso, ela está sempre se escondendo, fazendo com que nunca seja possível
apreendê-la por completo.
Ao brincar com a
natureza, a criança entra em contato com as forças primordiais que sustentam a
vida e nutrem esse inesgotável fluxo. E essa
experiência do brincar permite que ela faça a conexão, que ela se transporte desde o universo natural de onde emergiu para o cultural
onde nasceu. Assim é que ela vai entendendo o mundo.
Toda criança, ao
nascer, é natureza pura. Se a intervenção
cultural for delicada e suave, ela poderá nadar nesse mar de onde veio e ir
gentilmente se misturando no ambiente humano. O mundo humano anda
provisoriamente muito afastado dos outros seres vivos com os quais temos vivido
há milhões de anos e sem os quais não teríamos chegado à forma atual, de como
nós somos.
Nós somos a natureza e é na infância
que o desenvolvimento biopsíquico pode se dar de forma conectada à fonte de
vida ou, ao contrário, separada dela.
Sem o contato direto com a natureza
como formular uma compreensão do mundo que seja elaborada e sofisticada como
ele próprio? Temos alienado as nossas crianças da fonte de energia e de
sentidos.
O medo da natureza, tão comum na atualidade, vem do
desconhecimento. Desconhecimento da experiência primordial de pertencimento. O
conhecimento científico não dá conta de oferecer as respostas necessárias, seja
no campo da ética, do senso comunitário ou da saúde psíquica, como diz Gandhy.
A natureza não é só
o que esta lá fora, longe, nas florestas e nos campos. Ela está em nós e se
revela no humano por meio da imaginação, por meio da intuição, a partir do nosso ambiente
interior. Criar ambientes que favoreçam a interação com a natureza pra quem vive
nas cidades inclui, não só o uso de materiais naturais, a presença de plantas,
animais, água, terra etc, mas também lugares que ofereçam a possibilidade de recolhimento, de liberdade e estimulem a imaginação criadora.
Imagem: Desenho de Dora, minha filha

Bióloga
e socióloga, é autora dos livros “Como Cuidar da Natureza” e “Conservar e
Criar”, sócia-diretora do Instituto Romã e
consultora do projeto Criança e Natureza do Instituto Alana. Ministra cursos,
vivências e palestras para aproximar as pessoas do ambiente natural. Acredita
que a criança é a natureza se tornando humana e, por isso, precisa conviver com
ela para seu desenvolvimento sadio e integral.